domingo, junho 27, 2004

Anotações descoordenadas sobre o deslumbrante documentário Ser e Ter (resumidamente: um ano na vida de um professor e de seus alunos do ensino fundamental e maternal em uma escola provinciana francesa de turma única):


1 = um) Existe algo de mágico na maneira como o diretor Nicolas Philibert se dirige ao seu, literalmente, ambiente de estudo: um esmero incalculável na obtenção das mais diversas reações quando homens e mulheres em miniatura recebem pequenas recompensas e castigos; um dinamismo que coloca em perspectiva relativizada o encaixe dos pequenos em alguma estrutura social planejada (noção de hierarquia abstrata = tratamento civilizado e respeitoso ao professor e demais colegas, tolerância, cooperação e camaradagem); e além de tudo, revelar momentos quase cruciais na vida da comunidade, aqueles nos quais a sensação é a de "estou preparado. Mas para o quê exatamente?" (exemplo marcante: a transição do ensino fundamental para o médio como forma de deslocamento do ambiente caloroso para outro que os forçará a tomar decisões com maior ressonância e a lidar com suas fraquezas com cabeça erguida [dificuldades na socialização é recorrente], sem a figura distintivamente mediadora do professor antigo). Em alguns momentos minha 'memória afetiva' irrompeu bruscamente a projeção: dificuldades para se comunicar (eu: fonoaudiologia no primário; interação precária com os demais); memorização falha, mesmo se tratando de repetições sucessivas ao dito dois segundos atrás; laços professor/aluno (as inesquecíveis 'tias', excetuando o grau de parentesco) etc.


2 = 1 + 1 = dois) Fascinante é especialmente a figura do professor: central, rigorosa e maleável, gentil persistência misturada com um leve autoritarismo, busca o conhecimento alheio no equilíbrio entre o indivíduo e o externo, na opinião própria que pode contestar ou aceitar os parâmetros de outro colega. Seu mantra é: "Você é esperto o suficiente para resolver isto." e o grande trunfo conquistado é o de incentivar a auto-confiança desses recém-formados indivíduos para suas habilidades que estão despontando aos poucos. Quando uma menininha lhe diz que quer ser professora quando crescer, ele aproveita esse 'material' e começa a criar condições para o desenvolvimento desse senso de futuro próximo nela e no restante. O professor pergunta se a garota gostaria de mandar, assim como ele o faz; e depois, se dirige aos outros, indagando sobre suas insipientes preferências profissionais. Quem disse que a vaga insipiência infantil não deve ser levada em consideração?


3 = 1 + 1 + 1 = 2 + 1 = três) Em alguns momentos, Ser e Ter atinge o sublime; e isso não acontece com falsas promessas de que a vida será um mar de rosas para os futuros alunos do ensino médio, ou que pessoas de comportamentos opostos devem se separar para a manutenção da harmonia, ou ainda que 'tudo dará certo' para um de seus alunos, cujo pai tem câncer. Não, o pulso racional utilizado no decorrer das aulas continua atuando fora delas, nessas breves reuniões com seus 'parceiros'. Sua nova vida pode não ser rósea a princípio mas eu te ajudarei a manter um contato social mais amistoso com seus novos colegas, tratemos de desmistificar esse medo tolo; um time deverá ser formado, afinal, ambas as partes estão em igual situação, tratemos de colocar as diferenças de lado; doenças são fatos constantes na vida de cada um, "você é forte o bastante para superar isso".


4 = 1 + 1 + 1 + 1 = 2 + 1 + 1 = 2 + 2 = 3 + 1 = quatro) A câmera, em posição de atenta observadora, continua a espiar na busca por outro momento de introspecção e extroversão daquela galeria com que possa trabalhar. Ou das carinhas de espanto ao descobrirem a infinidade dos números. Ou das de genuína peraltice na fuga desastrosa de uma abelha. Ou ainda, dos deveres de casa, feitos com freqüência religiosa, na presença de toda a família, cada um opinando erroneamente sobre a inexatidão da divisão proposta pelo exercício. O diretor Philibert se esvai na caracterização do verdadeiro mestre em cena: o professor. O ritmo pausado do documentário apenas reflete seus métodos encantadoramente tradicionalistas. A candura do olhar do Mestre para sua sala vazia após término do ano letivo é revelada com a mesma calma e suavidade anteriores. O intercâmbio da ótica, a qual mira seus pequeninos objetos de reflexão, entre artesão (diretor) e Mestre (professor), de modo que um jamais se sobreponha, ou prejudique a coordenação ritmada do outro é o elemento que alça Ser e Ter ao nível dos grandes filmes. Afinal, se a aprendizagem e o crescimento englobam a percepção de que os mecanismos da vida nem sempre funcionam a seu favor ou o que nos foi dado parece insuficiente diante da respectiva necessidade, ou seja, que um momento é apenas um momento, Ser e Ter ilumina nossos sentimentos nos fazendo perguntar: Quando eles deixam de ser apenas mais um dentre tantos outros? Seriam eles suspensos de outras experiências a partir da conquista progressiva da maturidade?

PRO-


Breve: Ondas do Destino.
Sensibilidade estética:




















quarta-feira, junho 23, 2004

Editado: adicionado /Miami Blues/.
Futuros complementos: término do coment. de Primavera - blah blah - e... Primavera e início dos de Shrek 2, Pérola e Blues (eu digo início porque, bem, err)


Shrek 2 mixed+

É deliciosa a auto consciência da esculhambação na maior parte da projeção, o mesmo não se pode dizer dos trechos nos quais ela assume tons ligeiramente fora de controle artístico, quase como um monstro destruindo (através da aliança) seu criador/fonte criativa ou algo assim (licença poética: tem um Frankenstein no filme!). [devo escrever mais - e melhor, felizmente] CONTINUA...


Primavera, Verão, Outono, Inverno e... Primavera pro+

Provavelmente não acumula muito mais que um 'painel naturalista das leis que regem ações e respectivas consequências' e grande parte de seu encanto advém dessa simplicidade: personagens aparentam agir em confluência com as estações do ano, as quais no filme funcionam como um modelo organizacional narrativo e um guia abstrato que coordena o mundano (ex: no inverno, a memória afetiva do Mestre é 'congelada' para a posteridade; no outono, o antes preso às raízes, é levado para o desconhecido etc.); o espaço é revelado segundo a lógica do mantra 'e a vida continua', sendo reocupado constantemente pela possibilidade eterna de vida... CONTINUA...


Moça com Brinco de Pérola mixed+

Ou 'Moça Presa na Teia do Desejo' etc. Nota para o diretor: a inexpressividade é uma forma de tornar a sublimação sexual mais palpável mas também torna minha poltrona mais confortável do que deveria (frieza narrativa + aconchego do assento = Zzzz); mesmo assim, há muito o que gostar. [obs: eu não cochilei por um minuto, mas minhas pálpebras estavam mais pesadas que o teor populista dos documentários de Michael Moore] CONTINUA...


/Miami Blues/ pro+

Sério, fabuloso arremedo 100% destoante de um conjunto 100% desigual. CONTINUA...



Mudanças radicais nas cotações: PRO+ | PRO | PRO- | pro+ | pro | pro- | mixed + | mixed | mixed - | con + | con | con- | CON, depois coloco uma escala comparativa com a de 00-100.


sábado, junho 19, 2004

Segue outra manifestação desengonçada da minha adoração por PDL. Se o leitor já está cansado de tanta embrumação solene e reverente pare por aqui e volte somente com meus comentários futuros para o filme coreano com as quatro estações no título, conferindo uma noção cíclica ao tempo, espaço e vida.


Na minha modestíssima, notoriamente tortuosa opinião, uma cena de (...) Embriagado de Amor (...) desmonta toda a linha de produção de Filme de Amor cujo produto para consumo é a 'representação do desejo'. É aquela mesmo, a idéia de conversa aconchegante ao pé do ouvido entre travesseiros com pena de ganso e almofadas estampadas para PTA. É impressionante como a sinalização de Watson por um local quase tetricamente patético é/será eficiente. Ao juntar Amor & Violência no mesmo saco e esperar em retorno alguma manifestação da sua Presença Iluminada em Sandler, ela se metaforiza em um bode expiatório que concilia as várias facetas problemáticas dele ('isso é bom, isso é gostoso' após a experiência de trocar mutilações das mais graciosas com ela), e principalmente, essas facetas em (des)equilíbrio com o mundo (o disque-sexo corrupto representa uma ameaça para esse universo que lhe deu amor e conforto). Não é apenas uma forma dela entrar em contato com ele, mas também um modo de incitar alguma conexão entre Sandler e as possibilidades remotas de um ambiente saudável para a manutenção da relação. O cerne da questão está em separar a apatia do convívio social de Sandler com suas chances restauradas de redenção, quebrando, assim, a idéia de causa e conseqûencia e retirando das mãos de Sandler toda a provável justificativa que ele teria para continuar acomodado, paralizado pelas neuroses. O divisor de águas atende pelo nome de Emily Watson. E quando o filme caminha para os surpreendentes minutos finais, o que observamos é Sandler disposto a sair do concreto que o rodeia em Los Angeles e mover toda sua fúria justificadamente moralista para Utah, com o telefone na mão ('satisfação garantida ou a devolução imediata'), o mesmo terno azulado, a mesma aparência de líder da Vingança dos Excluídos etc., um super-herói hiperbolicamente inflado pelas gentis palavras de agressão mútua de Watson ('eu vou mastigar seus olhos' etc.) que o levam a negociar uma Paz Armada consigo mesmo (a confissão dele: 'eu quebrei o banheiro do restaurante') e finalmente o armistício, rendição total e incondicionada: ele se rende a ela, ele se rende ao mundo, a música do órgão o qual ele toca se rende lindamente às composições de Jon Brion, eu me rendo ao filme etc. A saudável bandeira branca simboliza eternamente o monumento que PDL representa. Isso pode não ter qualquer relação com o virtuosismo ecleticamente morto, plenamente irritante etc. de Filme de Amor, mas só queria deixar claro que a representação do desejo pode surgir das mais variadas fontes e formas, melhor ainda quando Watson deixa claro que suas tentativas apaziguadoras arremessaram o casal em uma espiral de felicidade tão atordoante que a partir de agora (do desfecho) eles se lançam às dificuldades e prazeres de consolidar as bases do relacionamento de cada dia ('so here we go').

*lágrimas*
*suspiros*



sexta-feira, junho 18, 2004

3 Filmes Nacionais. Argh, etc. Terça assisto Shrek 2, Respiro e Primavera, Verão, Outono, Inverno e... Primavera.

MULHER (1931, filme mudo restaurado pela Petrobrás, visto no Odeon Br) 44
O OUTRO LADO DA RUA (2004, Odeon Br) 50
FILME DE AMOR (2003, Estação Paço Imperial) 23

* mensagem de O FILHO (abaixo) restaurada, não pela Petrobrás, infelizmente.

quinta-feira, junho 17, 2004

Cápsula:

O FILHO (86)

Parece transitar inteiramente pelas conseqüências de ações irreparáveis que pedem a todo instante, vestígios do esquecimento rancoroso ou da solidariedade egoísta (os quais são basicamente recursos idênticos para superação pessoal ainda travados pelo inevitável nó na garganta), inclusive alternando as idéias de construção (carpintaria = reparação de danos ou fabricação de peças novas de pronto) e desconstrução (a morte do filho = implora por alguma resolução para mãe e pai envolvidos) para endossar o ponto de vista de que é impossível definir uma pessoa (o protagonista) através da glorificação ambivalente: a) do seu desprezo (reação ao novo casamento da ex-mulher, algo familiar está se revolvendo contra a inércia, até quando ele ficará anestesiado? = origina atitudes vigorosas que espantam a comodidade da dor insuperável e a condescendência para si; a invasão do apartamento de Francis seria uma aproximação com que fins exatamente: conhecer as táticas do 'inimigo' para uma 'batalha moral' ou o início do processo do perdão?; o coelho na estrada era fato?); b) da sua compaixão (ratificada maravilhosamente pelo entendimento diretores/objeto no equilíbrio aúdio-visual que confere uma atmosfera de urgência insuspeita às futuras decisões, a nuca de Gourmet é um ás da expressão dramática). Resumindo: cicatrização <--> aceitação --> auto-controle.


terça-feira, junho 15, 2004

THE KID STAYS IN THE PICTURE / O SHOW NÃO PODE PARAR 72 (comentário encorpado virá mas adianto logo a maestria dos últimos 15 minutos, a colagem de cenas de filmes produzidos por Evans, seu trabalho, dedicação pessoal e tudo o que isso possa acarretar sugere/ocasiona/endossa sua derrocada etc.; mesmo convencional com todo delirium de grandeza pós zé ninguém, a superação das adversidades etc. Observações deliciosas como: no ano de lançamento de Love Story, a taxa de natalidade subiu nos EUA etc. Pena que os insights em O Poderoso Chefão são esparsos e Coppola é pintado meio superficialmente nos trechos de Cotton Club. De qualquer forma extremamente vibrante, pulsante, punjente etc. Etc.)

/IRREVERSÍVEL/ 83
/IRREVERSÍVEL/ 83 (algo como reavaliar o caos, relativizar o antes e depois. A vida destroçada deles motiva a (re)construção da dita por nós e, milagre, isso parecer tão, ahn, saudável, poético, místico, surpreendente etc. Absolutamente encantador (sic.), agora é só achar I Stand Alone em algum beco underground para o meu bel prazer. Comentário maior vindo)

Trechos de BAD BOY II: Da série Família Escolhendo Filme. Não tinha tempo para terminá-lo (a viagem de volta, péssima, dormi pouco, saudades infinitas etc.) então fui salteando as cenas de ação com meu irmão (SMACK!) e, honestamente, muito divertido; quebra, quase estraçalha, as convenções psicologicamente equilibradas, sexualmente atenuadas, polticamente conscientes da rotina cabum-crash-ana. Talvez a maconha surtiu efeito mas enfim, um novo Nouvelle Action Pa-Pow Blow Job-Hip-Hop-Up-Down Cinema surgiu. E é das cartilhas mais formalistas --> Godard :: Bay (notem o "2" substituído por "II" = sintomático na minha opinião), algo como 59.

Ah. O DIA DEPOIS DE AMANHÃ (12; visto no dia 11 de junho, 11 + 1 = 12 = cotação engraçadinha) demanda um nível de abstração que eu não consegui desenvolver e repentinamente: pfffff-off. O Menino com Câncer e o Garoto Rico Falando para o Garoto Donnie Darko Problemático Devido à ** Separação dos Pais ** "Conte para Ela o que Você Realmente Sente", sabe, são, sabe, aquilo, tipo, sabe, complexo cara e tal, é o fim do mundo happening, man, nobody but us, you are soooo fucked up unless ya have Dennis Quaid as your fuckin' regretable father, holy christ, mamma mia, mein gott, meu deus. Eu diria que é também universal, assim, sabe, fala em cada coração de uma maneira bem singela, particular.

E O FILHO, que cresce na minha memória a cada ultrassom/parto, será o protagonista do próximo texto. Tomara que não seja caso de miscasting. (haha)

sábado, junho 12, 2004



PIRATAS DO CARIBE (61) Interessante o modo como a trégua é forjada para benefício próprio, múltiplos pontos de vista são reunidos em um tom de honesta ambivalência (confusão entre o dito e o feito, acordos vigorando até uma das partes recobrar o bom senso), os signos de conduta são frequentemente dotados de hierarquia abstrata (os subordinados sustentam o poderio do capitão, o qual já foi um comandado rebelde e teme que seus, agora, tripulantes sigam a risca seu curriculum vitae) e todas as partes parecem se envolver uniformemente no todo narrativo, os núcleos se entrecruzam permanentemente até porque as necessidades de um são as vontades do outro etc. Muito bom notar a ausência de vulnerabilidade no combate corpo a corpo (os piratas do Pérola Negra são imortais) o que traz ao filme uma bem-vinda sensação de tempo perdido, adiamento prolongado da provável vitória, que virá somente se um dos acordos mirabolantes for quebrado no instante certo. Pena que além de seguir as Regras da Boa Pirataria, o Código do Blockbuster que Se Preze também é levado em consideração com subtexto do amor se manifestando entre classes sociais díspares, alguns detalhes de caracterização unilaterais (especialmente na tripulação amaldiçoada, cuja atitude é a reversa na quebra do feitiço; isso é dificilmente algo ruim - potencializa o efeito da maldição nesses códigos morais e como eles acabaram sendo padronizados devido ao desvio de conduta e perda da condição humana de morrer [temer a morte = respeitar a vida] - mas, nesse caso, a mudança parece súbita e desonesta, como um artifício para a remoção desses obstáculos), animais/coadjuvantes fofinhos/engraçadinhos, a vasta e densa temática da ambição é desenvolvida com o máximo de preguiça (a cobiça nos impele --> consome; primário na minha opinião) etc. Mas Depp é o que há: rompantes vigorosos se misturam a uma consciência do que é possível se fazer em cada ocasião; suas regras mais maleáveis apenas conferem ao mesmo a verve de anti-herói dos Sete Mares, com alguns segredos escusos, ofertas bem pensadas e fama alçada com empurrão alheio. Personagem realmente surpreendente/bem desenvolvido porque mesmo atrapalhado, obsessivo, desequilibrado, transtornado consegue ter o mínimo de postura crítica (= ironia, escárnio) e amor ao 'trabalho' ("Traga-me o horizonte.").



Comentários para O FILHO, O DIA DEPOIS DE AMANHÃ e O TERCEIRO TIRO amanhã (ou depois de amanhã).

sexta-feira, junho 11, 2004

/O FILHO/ = 86 (isso é que é cinéfilo de verdade: senta no chão para assistir a um filme - pela terceira vez, diga-se - de um dos menores países do mundo - Bélgica - porque o mini cinema de arte santista é constrangedoramente minúsculo para uma platéia grande, porém burra. Os comentários no final da sessão me deixavam vermelho apenas por estar ouvindo 41 seres humanos destroçando minhas esperanças no intelecto alheio inclusive, virando para mim e perguntando: "Está esperando o final do filme?" [isso se deu porque sempre permaneço em transe até a conclusão dos créditos - ou até sua interrupção pelo lanterninha apressado para ir ao banheiro -, era o único lá com outro casal de velhinhos e eles soltaram a bomba, talvez devido ao final mesmo ser altamente não conclusivo, porém, plenamente satisfatório como poucos])

PIRATAS DO CARIBE: A MALDIÇÃO (boo woo) DO PÉROLA NEGRA = 61


Amanhã: O DIA SEM-SER-ESSE-O-OUTRO; O TERCEIRO TIRO & ROGER DODGER ou /IRREVERSÍVEL/ ou BARAN ou /ABAIXO O AMOR/ ou PAULINHO DA VIOLA ou GUERRILHA SEM FACE (depende do humor, estou mais inclinado a escolher DODGER ou GUERRILHA embora parte do meu íntimo quer ser violada com IRREVERSÍVEL novamente - NÃO PARA! NÃO PARA! MAIS UMA VEZ! ISSO! FOI? ahn FOI!)

quarta-feira, junho 09, 2004

Então é o seguinte: meu humor para críticas longas é diretamente proporcional à quantidade (e qualidade) de comentários na caixa.

Se o ibope aqui aumentar consideravelmente eu apresento minhas cartas da manga:

PDL
Elefante
10 Cenas de Filmes Lançados em 04

Tá, é direito dos leitores de blog (artigo 23, inciso 4, parágrafo 3) não responderem etc. e geralmente não o fazem por preguiça, ou achando que não contribuem para a vida do autor. Ledo engano, mesmo os comentários banais são estimulantes de alguma forma e acho que nunca destratei ninguém, ou fui desagradável etc. E, francamente, os filmes que vejo estão disponíveis em qualquer esquina, então não custa nada expor pontos de vista, isso poderia enriquecer o que já escrevi, clarear minhas observações (as quais sei que saem ocasionalmente truncadas) etc. O que eu mais quero é confrontação --> complementação, mas vocês insistem em permanecer na defensiva de modo que acho que o coeficiente da minha ultilidade marginal aqui é menor que o das aulas de Economia sob meus miolos. Isso provavelmente desencadeará uma crise que resultará em a) somente filmes vistos com as devidas cotações; b) o fechamento total desse espaço (ahn, espaço, hein?).

segunda-feira, junho 07, 2004

OSAMA | 24

Basicamente um filme padronizado em impressão gráfica com a mesma estrutura semântica dita revelatória - diria que a imprensa, ávida pela situação conturbada do Oriente Médio, é uma platéia em potencial - e idêntico corpo organizacional ao de um documento-histórico-engajado que se esquiva apavorado diante da radicalização de seu próprio tema. E ainda não chegamos exatamente ao fundo do poço: já que Osama veio ao mundo após a queda do Taliban e o filme se passa, obviamente, nesse regime, a falta de implicações políticas é inaceitável. O diretor Barmark não optou por se debruçar diante do Antes & Depois (em caso afirmativo, mostraria provavelmente como as velozes transformações políticas dessa dissolução não foram acompanhadas por cicatrizações iminentes das ramificações do 'pavor instalado' no Afeganistão; as bombas americanas conseguiram apagar o passado? Trilhar o presente?), a via escolhida é mais complexa e instigante e, portanto, a decepção é monumental diante de qualquer passo em falso. Pena que ele fez um cooper matinal na direção errada. A partir do momento em que o seu olhar está condicionado externamente ao interno (ou seja, ele avalia a partir de novos dados - o 'depois' -, os antigos - o 'antes') era de se esperar algum fio que costurasse as passagens do presente vivido à expectativa de um futuro e - aí (deveria) entra(r) a mão do diretor - dessa expectativa ao 'futuro real' capitalizado pelo mestre-de-obras; o filme deveria supostamente demarcar criticamente a fronteira entre a idealização e o desencanto, derivadas das perspectivas da população afegã em relação ao futuro político-social e mostrar que ambos são conceitos relativos e dependem do ponto de vista cujo diretor tem pleno domínio (entenda: a idealização quer estabelecer o bem-estar comum, assim como o desencanto, o que os diferencia é o sentimento momentâneo do quão insustentável é a situação e quais são as possibilidades de melhora para esses diversos pontos de vista, conflitantes e complementares). Algumas 'pistas' da insatisfação dos afegãos com o Taliban são dadas alaetoriamente (convenhamos, é o que não falta) e a impressão que tive era de um registro meramente documental/conceitual, que parece ter sido feito durante o regime e não, depois - o que é particularmente grave ao constatar que Osama é o carro-chefe do 'novo cinema afegão'. O que temos a partir daí é a incapacidade de Barmark em deixar uma marca pessoal no projeto, a qual poderia ser uma espécie de redenção levemente insuspeita apenas com o seu olhar carinhoso de que 'tudo dará certo; se ainda não, é porque estamos no caminho' incidindo naquela galeria sofrida. Mas não, temos aqui a velha Festa da Vitimização sublinhando com tinta vermelho-sangue-batido todos os rituais pelos quais nossa heroína atravessa em busca do pão de cada dia. Tudo da maneira mais manipulativa possível-imaginável, a menina só quer a subsistência da família e não salvar-o-mundo-de-cruéis-terroristas-barbudos e ainda assim, sofre muito (ex: sua mãe diz que tem vergonha de tê-la como filha etc., e o público fica abismado: "Mas ela está sustentando você, sua desnaturada!"). Cada um desses rituais (banho, marcante nesse sentido) apenas apregoam a mais triste constatação que se pode fazer a uma obra que se propõe a tal tarefa: "aaaaaah, então é iiiiiisso que acontece às escuras? Meu Deus, a) "que filme corajoso" pensam os de QI < 90; b) "que filme covarde" pensam os de QI > 90. Seria essa a porção revelatória de Osama? Contraditório, porque a câmera se afasta no momento da execução do jornalista americano e da consumação do casamento da protagonista. Que verdade nua e crua é essa, quando são alternados momentos da jovem presa com a mesma pulando corda alegremente? Ou quando descobrimos que o jornalista sentenciado é o mesmo dos minutos iniciais com a ajuda prolífica de uma flashback? Está aí a marca do diretor: a crueza e verosimilhança da História somente se fazem valer com a dinâmica do mexer os pauzinhos na 'sensibilidade estética', pena que ele não é natural do Japão. A comida está no prato, mas não na boca, então, o que sobra para ser digerido?

Obs: o trecho "mas não na boca" indica uma falha de contato dele-comigo e não um desejo meu de que o diretor me dê o material mastigado e de bandeja. Longe disso.

Eu não gostei desse meu comentário, na verdade, achei muito fraco, mas enfim, vocês têm o direito de me ver em apuros uma vez na vida... outra na morte.

sábado, junho 05, 2004

ALGUÉM TEM QUE CEDER (70): Quase um tour de force (sendo 'quase' por opção, justificada pelas truncagens sitcômicas nas quais a parcela reveladora eclipsa com vigor o potencialmente perigoso 'atravancamento' da naturalidade no trato dos personagens - fase: Grandes Mudanças -, como fortuitos quebra-molas e pardais indiscretos em uma rodovia) pelas tentativas frustradas de reconciliação de Keaton com sua jovialidade e de Nicholson com seu ritmo, tempo = dinâmica, lógica interna; 'frustradas' pelo fato do Cálice Sagrado de um se localizar exatamente dentro do Baú no Fim do Túnel do outro e justamente aí reside o coeficiente da memorabilidade do filme: o desafio primordial é acertar os ponteiros de horas e minutos de ambos - resultando em um eficiente intercâmbio de mão-dupla (agora, caso o fluxo de sentimentos genuínos de uma seja maior que na outra, temos um descompasso que será brevemente - exatamente 128 minutos - depositado nessa relação de uma forma inicialmente perturbadora mas finalmente, harmônica = isso basicamente atenua as cenas tipicamente 'rezando-pela-cartilha-Amém.', como as recaídas de Nicholson pós-sexo com Keaton, com olhar mirando qualquer rabo de saia de passagem; até porque o desabafo dela na porta do restaurante é algo assombrosamente tocante/verdadeiro e sublinha com exatidão o dilema do "eu amei mais, eu me entreguei mais; não consigo controlar minha vida atual") -, para enfim, checar se o fuso está certo, se o Horário de Verão está ou não em voga etc., situações determinadas por fatores incontroláveis e recorrentes. Os conflitos são muito bem gerenciados e uma certa desordem é aplicada aos mesmos, o que tende a nos aproximar dos dois já que sabemos qual deve ser a seqüência de pequenos fracassos individuais/coletivos a ser seguida/superada (e isso é positivo: é aproximadamente uma atitude voyeur trazendo benefícios terapêuticos, é como manter os protagonistas livres para oferecer a mão à palmatória, sendo que já passamos por esse ritual/castigo diversas vezes, apenas para aprender com os erros etc.); apesar dessa previsibilidade bem inserida, os rompantes soam sempre orgânicos e naturais (o cho-rô-rô, acho sintomática minha vontade de chorar mais intensa que a de rir), provavelmente porque Meyers abraça de maneira tão apertada essa galeria ao mesmo tempo que dosa os níveis de exposição de cada um deles à felicidade de pertencer a alguém e tristeza de... pertencer a alguém. Alguns promotores acusam o filme de categorizar os relacionamentos amorosos por idade, mas não, NÃO e NÃO. Creio que o único argumento favorável que esse reles-mortal-futuro advogado pode usar é: a consciência de que as afinidades eletivas podem ser traçadas com lápis esvai para uma lógica mais consistente, a de que elas são demarcadas com caneta, sem corretivo ao lado; tive a impressão de ver personagens lidando pela primeira vez com algo inexorável justamente porque eles querem que assim o seja (Keaton quer sorrir e controlar minimamente as rédeas da nova vida que se anuncia; Nicholson, sossegar o facho; Peet, uma família constituída; Reeves, conexão independente de alhos e bugalhos), com a sensação de que algo será eterno enquanto durar. Basta ver: Pett e Reeves não 'terminam juntos' e a belíssima cena da festa do pijama interrompida pela toda-vida-pela-frente Peet, que faz, instantaneamente, Keaton relembrar que tem metade-de-toda-vida-pela-frente, esvaziando todo o gás que preenchia seu desejo de emancipação do casulo ao invés de estourar de vez a boca do balão e constatar que o 'agora ou nunca' tem data marcada para encerrar suas atividades redentoras. ATQC termina quando tudo começa (a banca aceitou suas apostas, resta saber se o dado está viciado a seu favor: as tentativas de dissoluções desembocam ou em um estreitamento de laços ou em separação iminente; as trocas se intensificam e as resignações idem etc.) - e isso é tão bom.


quarta-feira, junho 02, 2004

*FF*

/BICICLETAS DE BELLEVILLE/ 59
/ANTI-HERÓI AMERICANO/ 63
OSAMA 26
/ALGUÉM TEM QUE CEDER/ 70
SER E TER 80