quarta-feira, janeiro 14, 2004

018. (14 Jan) A Enguia (Unagi, Shohei Imamura, 1997 | vídeo, gravado do Telecine Emotion, 117' | ½)

Provavelmente um surto coletivo, na premiação do Festival de Cannes, vitimou o júri quando premiou A Enguia com a Palma de Ouro, dividido com o maravilhoso Gosto de Cereja de Kiarostami. Os dois filmes conseguem transparecer o tema da angústia universal. Mas o único aspecto de A Enguia angustiante é a minha vontade imediata de fechar os olhos e proferir em uníssono: "E daí? E eu com isso?"; a história de "corno assassina esposa e pós reclusão penitenciária busca redenção com uma mulher também em conflito interior" é tão auto-consciente da sua limitação que Imamura parece fazer uma radiografia de recessão/reclusão de sentimentos tão vaga e imprecisa quanto sua capacidade de superar as convenções do surrado gênero ou whatever... A não interferência da enguia nos assuntos do protagonista se contrastando com a insistência (dela) na cumplicidade da dupla não vai muito longe (exceto nos ocasionais momentos de brilho (ex.: a recusa da marmita por ele, refletindo na que sua esposa infiel fazia quando ele ia pescar; a restrição do protagonista e sua abertura pessoal revelando-o um ser emocionalmente árido com a enguia, num espaço delimitado [no caso, o aquário] em que ele possa controlar, algo que não saia do controle dele = incapacidade de ver mudanças sob prisma positivo = prostração = revival’s e nostalgia aguçada etc. - mas isso não é focado primordialmente no filme, pena) porque (novamente) não há tato (observem o final! A complacência, o clichê do "já que me libertei do meu espaço limitado & limítrofe, você não será mais minha doce, amiga enguia expiatória, logo vou te soltar no mar, enquanto falo uma meia dúzia de belas palavras para impressionar o júri de Cannes" ou depois ele aceitando a marmita da garota provando que "Superou & Pagou O Preço Pela Sua Introspecção & Cia & Etc. & Outros Ritos Psicológicos & Etc." [*]), não há química, não há profundidade nem um compêndio das expectativas do protagonista, a não ser sobreviver, e isso não é um estimulante muito poderoso para manter, pelo menos, meus olhos abertos (e também quem se importa se o protagonista cara amarrada sofreu uma desilusão e não se recuperou até hoje? Quem se importa se a mulher tem um parceiro endividado até o pescoço? Ou com a mãe insana dela? Certamente, não eu). E...enguia? Que tipo de sujeito usa uma enguia como confidente? Meu conselho: protagonista = deite-se no divã do consultório mais próximo; mulher = assista a episódios de Sex & the City e se resolva!; diretor = aprenda sensibilidade com seus coleguinhas orientais Kar-wai e Miyazaki; enguia-animal = direto para o prato!; Enguia-filme = direto para a prateleira da Blockbuster. Pronto, agora que todos encontraram a paz interior recolho-me ao monastério. I say Amen to that!

[*] = Manual do amadorismo cinematográfico; capítulo 5, página, 67, mandamento XV.

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