domingo, abril 04, 2004

Pedaços de Abril (duh!):


123. (01 Abr) Con-fidence (James Foley, 2003 | Roxy, Santos/SP | 42)

Eu separei o título em duas partes justamente por se tratar de um filme que transita pelo gênero 'con', aka: tapeia-bobo. Sim, como a mui picareta tagline do cartaz afirma, poderia ter sido dirigido por David Mamet; pena que somente em sua versão "piloto automático". Não tive grandes problemas com a trama envolvendo o mítico "Golpe Definitivo e Ambicioso com Muito $$ Envolvido" cometido por uma "Equipe Desacertada", segue sem maiores pretensões com o fator inegável do divertimento e algumas oh-tão-surpreendentes-reviravoltas-de-onde-saem-de-súbito-aquelas-minhocas-verdes-das-caixinhas-de-surpresa-que-vitimam-a-tudo-e-a-todos, as quais mais inspiram dor de cabeça que "Uau, profissionais em ação!". Ganhamos de bônus um desnecessário Top das três mais perigosas ruivas, o idiota-anabolizado-que-se-passa-por-inteligente-surpreendendo-a-todos, uma suposta química entre os protagonistas ressonando como os pólos + e + (ou - e -) de uma pilha, uma psicologia constrangedora ("E quanto ao dinheiro?", confiança vs. ambição, "ladrão que rouba ladrão tem cem anos de perdão") e os inevitáveis questionamentos no estilo "Ela(e) é honesto?", "Até que ponto posso acreditar na sua palavra?" etc. Ainda estou para ver um filme, como Ladrão de Alcova, que realmente nos faz temer pela segurança de nossas carteiras. Ah, Lubitsch...

- A tela do cinema era quadrada, logo, muitas vezes, as palavras constadas nas partes laterais das legendas eram perdidas na projeção ("Lost in Projection", você pode pensar) como um filme em fullscreen em uma grande, gorda e grega televisão comum. Acho que para o pessoal santista (pelo menos os freqüentadores desse cinema), o formato wide é um "novo conceito cinematográfico", como a visão restaurada de uma pessoa cega etc.


124. (01 Abr) Funny Games (Michael Haneke, 1997 | vhs | 72)


125. (03 Abr) /A Promessa/ (The Pledge, Sean Penn, 2001 | dvd | 78)

Assim como o anterior listado, esse filme é a inquietude filmada; e o mais estranho é daí sair uma sucessão de tomadas que endossam a frustração inexorável do protagonista minando nossas expectativas de um thriller convencional (basta ver os minutos finais). O personagem de Nicholson faz uma promessa (pegar o assassino de uma garotinha) cuja concretização mais depende de um trabalho conjunto que dele próprio (como está recém-aposentado, essas atribulações em equipe não mais vigoram). E aí, reside uma ambivalência sublime: ao expôr sua "nova família" (notadamente a menina) ao perigo próximo, ele está tentando recobrar o senso de prioridades pessoais para ser capaz de constituir uma unidade entre as pessoas que ama (primeiramente, o interesse na menina e seus desenhos indicam uma certa propensão a cumprir a dita promessa, mas, aos poucos, percebe-se a existência de um vínculo entre o trio [as histórias contadas na cama, o relacionamento amoroso iniciado] presentes na oferta de alojamento do protagonista para as duas, que parece ser verdadeira e não uma via de potencializar o policiamento ao suspeito) aumentando, mas instantaneamente, age como se essa relativização só pudesse ser conquistada com a apreensão do assassino; logo, essa atitude mesmo com propósitos nobres (e individuais também: promessa cumprida = alívio no peso dos ombros, paz interior) não deixa de encerrar uma idéia egoísta, com a redenção espiritual em primeiro plano e as prováveis conseqüências relegadas como se suas chances de ocorrência fossem nulas. A angústia do filme provém dessa relação: sabemos a importância da mãe e filha na reconstrução de novos parâmetros para uma pessoa desnorteada com a perda da função nas engrenagens da sociedade, mas também reconhecemos que o peso de sua Palavra Firmada o corroe por dentro e, se depender dela, essa família só existirá no plano da idealização. Portanto, em cada cena na qual Nicholson conversa com a menina, buscando detalhes do assassino, fixando o balanço na parte frontal da casa e não no quintal (possibilitando um aumento do contato entre a dupla), observando (ao invés de agir decisivamente) a relação crescente dos dois e incentivando (ao invés de proibir) um encontro entre ambos percebemos que o conflito ali é insuportavelmente doloroso; a unidade se confronta com a coletividade, sendo que cada uma depende da outra e vice-versa. Até mesmo a abertura e desfecho indicam uma idéia de desespero cíclico, um contínuo estado de descrença e desencanto, afinal, ele perdeu a confiança da família e não tem conhecimento da morte da sua caça. É tão bem desenvolvido (com metáforas inspiradas sobre o fascínio pela pesca, peixes pequenos como isca viva a fim de atrair os maiores) que esqueço em um estalo o burocratismo da primeira meia hora de projeção.


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